quinta-feira, 22 de julho de 2010

Café para viajem - Um guia simplificado para auxiliar diálogos...

The World Café apresenta…
Café to go! (Café para Viagem!)
Um guia simplificado para auxiliar os diálogos durante um World Café...
Diretrizes do Café
Conduzir um excelente Diálogo de World Café não é difícil – é limitado somente pela
sua imaginação! O formato do Café é flexível e se adapta a muitas circunstâncias
diferentes. Quando estas diretrizes são usadas em combinação, fomentam o diálogo
colaborativo, compromisso ativo e possibilidades construtivas para ação.
Tenha Consciência do Propósito do World Café
Primeiramente preste atenção ao motivo pelo qual você está reunindo as pessoas.
Saber a finalidade da sua reunião lhe permite considerar quais participantes
precisam estar lá e que parâmetros são importantes para atingir o seu objetivo.
Crie um Espaço Receptivo e Hospitaleiro
Os anfitriões de Cafés pelo mundo todo enfatizam o poder e a importância de criar
um espaço hospitaleiro – um que seja seguro e convidativo. Quando as pessoas
sentem-se confortáveis para serem elas mesmas, tornam o seu pensamento, fala e
escuta mais criativos. Particularmente, considere como o seu convite e o ambiente
físico podem contribuir para criar uma atmosfera acolhedora.
Explore Perguntas Relevantes
Encontrar e estruturar perguntas relevantes para aqueles que estão participando no
seu Café é fundamental e pode produzir profundos resultados. O seu Café pode
explorar uma única questão somente, ou diversas questões podem ser
desenvolvidas para dar apoio a uma progressão lógica de descoberta por todas as
diversas rodadas de diálogos. Em muitos casos várias conversações no Café tratam
de descobrir e explorar perguntas poderosas, enquanto acabam facilitando a busca
e descoberta de soluções eficazes.
Estimule a Contribuição de Todos
Como líderes, estamos cada vez mais conscientes da importância da participação,
mas a maioria das pessoas não quer somente participar, quer também contribuir
ativamente para fazer a diferença. É importante encorajar a todos os presentes no
seu encontro a contribuir com idéias e perspectivas, permitindo também que
qualquer um possa participar simplesmente ouvindo, se este é seu estilo ou vontade.
Conecte Perspectivas Diversificadas
A oportunidade de passear entre as mesas, conhecer novas pessoas, contribuir
ativamente com o seu pensamento e ligar a essência das suas descobertas aos
círculos de pensamento em constante ampliação é uma das características
marcantes do Café. Enquanto os participantes levam idéias-chave ou temas para
novas mesas, compartilham perspectivas, enriquecendo a possibilidade de insights
surpreendentemente novos.
Escute os Insights e Compartilhe as Descobertas
Por meio da prática de escutar em grupo e prestar atenção aos temas, padrões e
insights, começamos a sentir uma conexão ao conjunto maior. Após várias rodadas
de conversação, é útil participar de uma conversação em plenária. Isto oferece ao
grupo inteiro uma oportunidade de conectar os temas gerais ou perguntas que agora
estão presentes.
Uma rápida visão sobre as conversações do World Café
 Acomode quatro ou cinco pessoas em pequenas mesas estilo Café ou em
grupos de conversação.
 Estabeleça rodadas de progressivas de diálogo (geralmente três) de
aproximadamente 20 a 30 minutos cada.
 Perguntas ou questões que genuinamente importam para a vida das
pessoas, trabalho ou comunidade são iniciadas enquanto outros pequenos grupos
podem explorar perguntas semelhantes nas mesas próximas.
 Encoraje tanto os anfitriões de mesa quanto os participantes a escrever,
rabiscar e desenhar idéias-chave em suas toalhas de mesa ou anotar idéiaschave
em grandes fichas, post-it ou descansos de prato no centro do grupo.
 Após completar a rodada inicial de diálogo, peça para que uma pessoa
permaneça na mesa como a “anfitriã”, enquanto as outras atuam como viajantes
ou “embaixadores do significado”. Os viajantes levam idéias-chave, temas e
perguntas para as suas novas conversas.
 Peça para que o anfitrião da mesa dê boas-vindas aos novos convidados e
brevemente compartilhe as idéias principais, temas e perguntas da rodada inicial.
Incentive os convidados a ligar e conectar idéias provenientes das conversas das
mesas anteriores — escutando com atenção e refletindo sobre as contribuições uns
dos outros.
 Ao proporcionar a oportunidade para que as pessoas se movam em diferentes
rodadas de diálogo, idéias, perguntas e temas começam a se conectar. Ao final
da segunda rodada, todas as mesas ou grupos de conversação na sala serão
“polinizados” com insights de conversas anteriores.
 Na terceira rodada de diálogo, as pessoas podem voltar às suas mesas iniciais
para sintetizar suas descobertas, ou podem continuar viajando às outras mesas,
deixando o mesmo ou um novo anfitrião à mesa. Às vezes, uma nova pergunta que
ajuda a aprofundar a investigação é colocada para a terceira rodada de conversa.
 Depois de diversas rodadas de diálogo, inicie um período de compartilhamento
de descobertas e insights em uma conversação todo o grupo. São nessas
conversas estilo “plenária ou assembléia” que os padrões podem ser identificados, o
conhecimento coletivo cresce e as possibilidades para ação surgem.
Uma vez você sabendo o que quer alcançar, bem como a quantidade de tempo que
tem para trabalhar, você pode decidir o número e período de tempo adequado das
rodadas de diálogo, o uso mais eficaz das perguntas e as formas mais interessantes
de conectar e “polinizar” idéias.
Brinque, experimente e improvise!
Etiqueta do Café
Foque no que importa.
Contribua com o seu pensamento.
Fale através de sua mente e seu coração.
Escute para compreender.
Ligue e conecte idéias.
Escutem juntos os insights e perguntas mais profundas.
Brinque, rabisque, desenhe – escrever nas toalhas de mesa é desejável!
Divirta-se!
A importância da(s) pergunta(s) do Café
A(s) pergunta(s) que você escolher ou que os participantes descobrirem durante um
Café Diálogo é (são) crucial(ais) para o sucesso. O seu Café poderá explorar uma
única pergunta ou diversas perguntas poderão ser desenvolvidas para dar apoio a
uma progressão lógica de descoberta por diversas rodadas de diálogo.
Lembre-se que...
 Perguntas primorosas atraem energia e focam a nossa atenção ao que
realmente importa. Anfitriões de Café experientes recomendam fazer
perguntas abertas que geram respostas mais descritivas e narrativas em
relação às perguntas fechadas que geram respostas do tipo “sim” ou “não”.
 Boas perguntas não precisam indicar passos de ação imediatos ou solução
de problemas. Elas devem convidar à indagação e a descoberta em vez de
provocar um sentimento de defesa e busca de vantagem pessoal ou de um
grupo.
 Você saberá que possui uma boa pergunta quando ela continuar a aflorar
novas idéias e possibilidades.
 Apresente possíveis perguntas de pessoas-chave que vão participar do Café
para ver se elas mantêm o interesse e energia os demais participantes.
Uma pergunta poderosa
 É simples e clara
 Provoca o pensamento
 Gera energia
 Enfoca a indagação
 Aflora suposições inconscientes
 Abre novas possibilidades
5 Maneiras de Fazer o Conhecimento Coletivo Visível
Use um Profissional de Facilitação Gráfica
Em alguns eventos do World Café o diálogo coletivo é capturado por um profissional
de registro e facilitação gráfica, que desenha as idéias do grupo em flipcharts ou em
um mural na parede usando texto e elementos gráficos para ilustrar os padrões de
conversação.
Faça um Tour na Galeria
Às vezes, as pessoas colocam o papel de suas mesas na parede para que todos os
participantes possam fazer uma visita às idéias do grupo expostas durante um
intervalo.
Afixe os seus Insights
Os participantes podem colocar grandes cartazes ou Post-Its® com um único
insight-chave em cada um, em um quadro-negro, parede, etc., para que todos
possam revisar as idéias durante um intervalo.
Crie Agrupamentos de Idéias
Agrupe os insights dos Post-Its em grupos de afinidade para que idéias relacionadas
sejam visíveis e disponíveis para o planejamento dos próximos passos do grupo.
Faça uma História
Alguns Cafés criam um jornal ou livro de história para trazer os resultados do seu
trabalho a grandes audiências após o evento. Um profissional de registro e
facilitação gráfica pode criar um livro de ilustrações juntamente com o texto como
forma de documentação.
Como criar uma atmosfera de Café
Se você for reunir algumas dúzias ou algumas centenas de pessoas, é essencial
criar um ambiente que evoque um sentimento tanto de informalidade quanto de
intimidade. Quando os seus convidados chegarem, eles deverão ser informados
imediatamente que esta não é uma reunião qualquer.
 Se possível, selecione um espaço com luz natural e uma vista externa para
criar uma atmosfera mais acolhedora.
 Faça o espaço parecer como um Café de verdade, com pequenas mesas
que acomodem de quatro a cinco pessoas. Menos de quatro pessoas à mesa
poderá não proporcionar a diversidade de perspectivas suficiente, mais de
cinco pessoas limita a quantidade de interação pessoal.
 Organize as mesas do Café em um padrão não ordenado e aleatório, ao
invés de fileiras arrumadinhas. As mesas na calçada de um café, após estar
aberto por algumas horas, parecem descontraídas e convidativas.
 Use toalhas de mesa coloridas e pequenos vasos de flores em cada mesa.
Se o local permitir, adicione uma vela em cada mesa. Coloque plantas ou
folhagens pelo local.
 Coloque no mínimo duas folhas grandes de papel sobre cada toalha de mesa
juntamente com uma caneca ou copo de vinho cheio de marcadores
coloridos. Papel e canetas encorajam rabiscar, desenhar e conectar idéias.
Desta forma, as pessoas anotarão idéias conforme forem surgindo.
 Coloque uma mesa de Café adicional na frente da sala para o material do
Anfitrião e do apresentador.
 Considere expor imagens ou adicionar pôsteres às paredes (tão simples
quanto folhas de flipchart contendo citações) e toque música enquanto as
pessoas chegam e você as recepciona.
 Para honrar a tradição da comunidade e hospitalidade, forneça bebidas e
salgadinhos. Um Café não é completo sem comida e refrescos!
Use a sua imaginação! Seja criativo!
Materiais para o Café
 Pequenas mesas redondas de 91cm a 1,06 m são ideais, mas pequenas
mesas quadradas também funcionam.
 Cadeiras em número suficiente para todos os participantes e apresentadores.
 Toalhas de mesa coloridas.
 Papel de flipchart ou descansos de prato de papel para cobrir as mesas do
Café.
 Marcadores ou canetas hidrográficas (as canetas JUMBO FABER CASTELL
funcionam bem). Para maior legibilidade, use cores escuras, tais como o
verde, preto, azul e roxo. Adicione uma ou duas cores claras à caneca
(vermelho, verde claro, azul claro ou laranja) para adicionar ênfase.
 Um vaso com flores cortadas, uma caneca ou copo de vinho por mesa para
os marcadores.
 Uma mesa de canto para as bebidas e salgadinhos.
 Um mural (15cm de comprimento x 1,21m de altura) ou papel de flip chart
para tornar o conhecimento coletivo visível e fita adesiva para pendurar.
 Espaço plano de parede (mínimo de 30cm) ou duas lousas brancas giratórias
(10 x 15cm cada).
 Espaço adicional de parede (ou janela) para fixar trabalhos coletivos e/ou o
trabalho das mesas.
Opcional (dependendo do tamanho e objetivo)
 Retro-projetor e tela.
 Aparelho de som para as fitas e/ou CDs.
 Uma seleção de música ambiente.
 Microfones de lapela sem fio para os Anfitriões do Café, bem como
microfones sem fio de mão para as sessões em momentos de plenária.
 Cavaletes e flipcharts.
 Suprimentos básicos, inclusive grampeador, clipes de papel, elásticos de
papel, canetas marcadoras, fita crepe, canetas, tachinhas e lápis.
 Fichas coloridas de 10x15cm ou 12x20 (para anotações pessoais).
 Post-Its® de 10x15cm em cores vibrantes para postar idéias.
Eu sou o Anfitrião do Café, o que devo fazer?
O trabalho do Anfitrião do Café é garantir que as seis diretrizes para o diálogo e
compromisso sejam colocadas em ação. Mais importante que seguir normas é
vivenciar o espírito das diretrizes. Organizar um Café exige consideração, talento
artístico e cuidado. O Anfitrião do Café pode fazer a diferença entre uma
conversação interessante e um diálogo transformador.
 Trabalhe com a equipe de planejamento para determinar o objetivo do Café e
decida quem deverá ser convidado para o encontro.
 Escolha o nome do seu Café de maneira adequada ao seu objetivo, por
exemplo: Café da Liderança; Café do Conhecimento; Café da Estratégia;
Café do Descobrimento, etc.
 Ajude a criar o convite.
 Trabalhe com outras pessoas para criar um ambiente de Café confortável.
 Recepcione os participantes conforme forem entrando.
 Explique o objetivo do encontro.
 Coloque a pergunta ou os temas para as rodadas de conversa e assegure-se
que a pergunta esteja visível para todos em um retro-projetor, flipchart ou em
fichas sobre cada mesa.
 Explique as diretrizes do Café e a Etiqueta do Café e coloque-as no retroprojetor,
uma folha no cavalete ou em fichas sobre cada mesa.
 Explique como a logística do Café funcionará, inclusive o papel do Anfitrião
da Mesa (a pessoa que será voluntária para permanecer na mesa ao final da
primeira rodada e recepcionar os recém-chegados à sua mesa.)
 Durante a conversa, ande entre as mesas.
 Incentive todos a participar.
 Lembre às pessoas para que anotem as idéias-chave, rabisquem e
desenhem.
 Informe às pessoas, delicadamente, quando for hora de prosseguir e iniciar
uma nova rodada de conversa,
 Certifique-se que os insights-chave sejam registrados visualmente ou
apresentados, se possível.
 Seja criativo na adaptação das seis diretrizes do Café, para satisfazer às
necessidades únicas da sua situação.
Sou um Anfitrião de Mesa, o que devo fazer?
 Lembre as pessoas na sua mesa a anotar as principais conexões, idéias,
descobertas e perguntas mais profundas, conforme forem surgindo.
 Permaneça na mesa quando os demais saírem e recepcione os viajantes das
outras mesas.
 Resumidamente compartilhe os insights-chave da conversa anterior para que
os outros possam ligar e construir utilizando idéias de suas respectivas
mesas.
Mantenha Contato!
Assim como o processo do Café em si, este Guia está evoluindo. Conforme você vai
vivenciando a organização das suas próprias conversas de Café, adoraríamos saber
de você, sobre as suas experiências no Café, bem como as maneiras que podemos
fazer deste Guia mais útil. Entre em contato com o info@theworldcafe.com enviando
idéias e feedback. E para mais informações secundárias detalhadas, inclusive as
histórias do Café, dicas adicionais de organização, artigos de apoio e links
relacionados ao Café e iniciativas de diálogo, por favor, acesse o website
http://www.theworldcafe.com.
O que é um World Café?
Café Diálogo é um método de fácil utilização para a criação de uma rede viva de
diálogo colaborativo sobre perguntas relevantes a serviço de assuntos reais do diadia,
sejam da vida ou do trabalho. Nos negócios, os Cafés têm sido chamados de
várias maneiras para satisfazer metas específicas, inclusive os Cafés Criativos,
Cafés do Conhecimento, Cafés da Estratégia, Cafés da Liderança, Cafés de
Marketing e Cafés de Desenvolvimento de Produto. A maioria das conversas de
Cafés é baseada nos princípios e formato desenvolvidos pelo The World Café (veja
no www.theworldcafe.com), um movimento global em crescimento para apoiar os
diálogos relevantes em ambientes corporativos, governamentais e comunitários por
todo o mundo.
As conversações no Café também são uma metáfora provocativa, nos
possibilitando ver novas maneiras para fazer a diferença em nossas vidas e
trabalho. O poder de conversação é tão invisível e natural que geralmente o
ignoramos. Por exemplo, considere todas as escolhas de aprendizado e ação que
ocorrem conforme as pessoas vão de uma conversa para a outra, tanto dentro
quanto fora da empresa, com fornecedores, clientes e outras pessoas na
comunidade em geral. E se considerássemos todas essas conversas como um
grande e dinâmico Café, com cada função de trabalho sendo uma mesa em uma
rede maior de conversas vivas, que é o processo central para compartilharmos o
nosso conhecimento coletivo e modelarmos o nosso futuro? Ao nos
conscientizarmos do poder do diálogo como um processo fundamental para os
negócios poderemos utilizá-lo de maneira mais eficaz para o nosso benefício mútuo.
O que é essencial a respeito do método do World Café?
Delineamos uma série de diretrizes para colocar a conversação em funcionamento
por meio do diálogo e do compromisso. Se você utilizar essas diretrizes ao planejar
as suas reuniões, ficará surpreso com a qualidade dos resultados obtidos. Ao
organizar uma Conversação de Café usando todas essas diretrizes
simultaneamente, você descobrirá que é capaz de criar um ambiente de Café único,
onde resultados surpreendentes e úteis são mais que prováveis de acontecer.
O Café é construído sobre a suposição de que as pessoas já possuem dentro
delas a sabedoria e criatividade para confrontar até mesmo os desafios mais
difíceis. Dado o contexto e foco adequado, é possível acessar e usar este
conhecimento mais profundo sobre o que é mais relevante.
©2002 Whole System Associates. Por favor, fique à vontade para copiar e distribuir, reconhecendo a
The World Café Community como entidade autora.

Artemetodologia das auscultas



Segundo a definição do dicionário, auscultar quer dizer ouvir, identificar, diagnosticar os ruídos, procurar saber, investigar. A Ausculta Sociocultural será a principal artemetodologia usada nas rodas de conversa. Neste sentido, uma Ausculta Sociocultural propõe métodos para conhecer as relações subjetivas de um grupo, suas vivências, visões e desafios com o objetivo de fortalecer suas ações e intervenções. É portanto o espaço para a escuta qualificada e ampliada, no que diz respeito à dinâmica grupal, como processo para revelar espaços de convivência e atitudes de paz.
A artemetodologia das Auscultas propõe uma experiência participativa, que busca identificar os principais desafios de grupos jovens dos Pontos de Cultura, mapeando os conflitos existentes bem como formas e espaços de resolução. Essa visão global é fundamental para promover uma ambientação que protagonizada pela cultura, traduz a pluralidade juvenil ao mesmo tempo que a faz singular. Nossa proposta é humanizar as relações e aproximar pessoas no encontro de forma que sintam-se livres para conversar sobre qualquer assunto, sem medos ou restrições, facilitando o diálogo e a escuta para acolher com arte, em uma construção permanente cuja característica principal é a Cultura de Paz.
A Artemetologia se estrutura como um método socioafetivo que contempla a ambientação poética, acolhe através da arte, promove um círculo da confiança, constrói o objeto símbolo grupal, desenvolve mapas de convivência. Tudo isso para estimular a linguagem do coração, a vida como obra de arte, expressão e apreciação, e lugar do conflito com respeito e aprendizagem.
Nos grupos onde já foram realizadas as Rodas de Convivência é possível observar o fluir e o expandir da arte local, na perspectiva do que consideramos a Pedagogia da Circularidade. A roda é um espaço de favorecimento para identificação dos jovens em sua atuação cidadã, cultura local, cuidado da cidade, responsabilidade ética-comunitária, nas relações mais saudáveis, nas ações e expressões nos campos do conhecimento que facilitam a vida e legitimam o saber coletivo para construir a Cultura de Convivência e Paz.
As Auscultas Socioculturais trabalham as questões mais emergentes da população jovem dos pontos de cultura. Elas permitem um novo olhar sobre a realidade da juventude. Os principais objetivos são:
  • Qualificar a ação e os desafios de ser jovem;
  • A ação político-cultural do território;
  • Descobrir saberes e expressões criativas, ações multiplicadoras e exemplares;
  • Identificar espaços a serem fortalecidos;
  • Relações com o poder local e com o Programa Cultura Viva;
  • Formas de potencializar os pontos de cultura nas localidades;
  • Sonhos que devem ser concretizados;
  • A visão que têm uns dos outros, conflitos étnicos, de gênero, formas de convivência e formas de resolução;
  • Compreender a nossa visão de Cultura de Paz e o que entendem por Convivência e Cultura de Paz.

A arte de ouvir - Rubem Alves

De todos os sentidos, o mais importante para a aprendizagem do amor, do viver juntos e da cidadania é a audição. Disse o escritor sagrado: “No princípio era o Verbo”. Eu acrescento: “Antes do Verbo era o silêncio.” É do silêncio que nasce o ouvir. Só posso ouvir a palavra se meus ruídos interiores forem silenciados. Só posso ouvir a verdade do outro se eu parar de tagarelar. Quem fala muito não ouve. Sabem disso os poetas, esses seres de fala mínima. Eles falam, sim. Para ouvir as vozes do silêncio. Veja esse poema de Fernando Pessoa, dirigido a um poeta: “Cessa o teu canto! Cessa, que, enquanto o ouvi, ouvia uma outra voz como que vindo nos interstícios do brando encanto com que o teu canto vinha até nós. Ouvi-te e ouvia-a no mesmo tempo e diferentes, juntas a cantar. E a melodia que não havia se agora a lembro, faz-me chorar...” A magia do poema não está nas palavras do poeta. Está nos interstícios silenciosos que há entre as suas palavras. É nesse silêncio que se ouve a melodia que não havia. Aí a magia acontece: a melodia me faz chorar.
Não nos sentimos em casa no silêncio. Quando a conversa para por não haver o que dizer tratamos logo de falar qualquer coisa, para por um fim no silêncio. Vez por outra tenho vontade de escrever um ensaio sobre a psicologia dos elevadores. Ali estamos, nós dois, fechados naquele cubículo. Um diante do outro. Olhamos nos olhos um do outro? Ou olhamos para o chão? Nada temos a falar. Esse silêncio, é como se fosse uma ofensa. Aí falamos sobre o tempo. Mas nós dois bem sabemos que se trata de uma farsa para encher o tempo até que o elevador pare.
Os orientais entendem melhor do que nós. Se não me engano o nome do filme é “Aconteceu em Tóquio”. Duas velhinhas se visitavam. Por horas ficavam juntas, sem dizer uma única palavra. Nada diziam porque no seu silêncio morava um mundo. Faziam silêncio não por não ter nada a dizer, mas porque o que tinham a dizer não cabia em palavras. A filosofia ocidental é obcecada pela questão do Ser. A filosofia oriental, pela questão do Vazio, do Nada. É no Vazio da jarra que se colocam flores.
O aprendizado do ouvir não se encontra em nossos currículos. A prática educativa tradicional se inicia com a palavra do professor. A menininha, Andréa, voltava do seu primeiro dia na creche. “Como é a professora?”, sua mãe lhe perguntou. Ao que ela respondeu: “Ela grita...” Não bastava que a professora falasse. Ela gritava. Não me lembro de que minha primeira professora, Da. Clotilde, tivesse jamais gritado. Mas me lembro dos gritos esganiçados que vinham da sala ao lado. Um único grito enche o espaço de medo. Na escola a violência começa com estupros verbais.
Milan Kundera conta a estória de Tamina, uma garçonete. “Todo mundo gosta de Tamina. Porque ela sabe ouvir o que lhe contam. Mas será que ela ouve mesmo? Não sei... O que conta é que ela não interrompe a fala. Vocês sabem o que acontece quando duas pessoas falam. Uma fala e outra lhe corta a palavra: ‘é exatamente como eu, eu...’ e começa a falar de si até que a primeira consiga por sua vez cortar: ‘é exatamente como eu, eu...’Essa frase ‘é exatamente como eu...’ parece ser uma maneira de continuar a reflexão do outro, mas é um engodo. É uma revolta brutal contra uma violência brutal: um esforço para libertar o nosso ouvido da escravidão e ocupar à força o ouvido do adversário. Pois toda a vida do homem entre os seus semelhantes nada mais é do que um combate para se apossar do ouvido do outro...”
Será que era isso que acontecia na escola tradicional? O professor se apossando do ouvido do aluno ( pois não é essa a sua missão?), penetrando-o com a sua fala fálica e estuprando-o com a força da autoridade e a ameaça de castigos, sem se dar conta de que no ouvido silencioso do aluno há uma melodia que se toca. Talvez seja essa a razão porque há tantos cursos de oratória, procurados por políticos e executivos, mas não haja cursos de escutatória. Todo mundo quer falar. Ninguém quer ouvir.
Todo mundo quer ser escutado. (Como não há quem os escute, os adultos procuram um psicanalista, profissional pago do escutar.) Toda criança também quer ser escutada. Encontrei, na revista pedagógica italiana “Cem Mondialità” a sugestão de que, antes de se iniciarem as atividades de ensino e aprendizagem, os professores se dedicassem por semanas, talvez meses, a simplesmente ouvir as crianças. No silêncio das crianças há um programa de vida: sonhos. É dos sonhos que nasce a inteligência. A inteligência é a ferramenta que o corpo usa para transformar os seus sonhos em realidade. É preciso escutar as crianças para que a sua inteligência desabroche.
Sugiro então aos professores que, ao lado da sua justa preocupação com o falar claro, tenham também uma justa preocupação com o escutar claro. Amamos não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A escuta bonita é um bom colo para uma criança se assentar...





PARTICIPÂMETRO: UMA METODOLOGIA PARA PROMOÇÃO DO DIÁLOGO

“O diálogo é mais uma participação, na qual não jogamos uns contra os outros, mas com cada um deles.”
David Bohm



O que é o Participâmetro?

É uma metodologia fácil, inclusiva, didática, criativa e divertida que foi desenvolvida com a finalidade de promover o diálogo. O Participâmetro tem como objetivo educar e promover a participação equilibrada das pessoas num círculo de diálogo.


Como ele funciona?

Como um jogo participativo, onde os integrantes do grupo – que podem estar numa sala de aula, numa reunião de condomínio, numa audiência pública, numa reunião de trabalho, num papo entre amigos, etc - utilizam o participum, a unidade de medida imaginária do Participâmetro.



Funciona deste jeito: No início do diálogo – ou mesmo no meio dele – você distribui imaginariamente 10 participapara cada pessoa do grupo e pede para que durante o encontro ela utilize o maior número de unidades que puder. Quanto maior for a participação de cada um, maior será a utilização dos seus participa.

Você deve informar aos participantes duas coisas:
 Que somente no final do diálogo será revelado o valor de cada participum e quantos participa cada pessoa terá utilizado.
 Que o Participâmetro vai medir a participação verbal de cada um.

Comentário: Estas duas informações são muito importantes porque, em relação à primeira, um participante mais curioso logo fará perguntas tipo “Eu não estou entendendo este jogo, como vou saber quantos participa estarei utilizando ao abrir a boca?”. Isso o acalmará. Em relação à segunda, é para informar que não adianta o participante ficar calado o tempo todo e dizer no final que não participou verbalmente mas que participou muito, sim, porque prestou muita atenção... É claro que o silêncio é precioso e fundamental – e que talvez seja a essência de um compartilhar muito mais profundo – mas informe que ele não será objeto de estudo daquele dia. Peça ao participante para verbalizar o que estiver pensando durante o encontro.


Como saber quantos participa cada pessoa utilizou?

1º passo: No final do encontro, você pedirá ao grupo para eleger a pessoa (pode ser mais que uma) que mais participou do diálogo.  O facilitador informará, então, que a pessoa que utilizou os seus 10 participa foi exatamente aquela que o grupo acabou de eleger.

Ao ser eleita como tal, esta pessoa se tornará a referência de participação para os demais. O facilitador anotará num papel ou num quadro o nome da pessoa eleita seguido do número 10.

2º passo: Comparando-se com a pessoa eleita, cada membro do grupo dirá quantos participa ela imagina ter utilizado durante o diálogo. Como isto será feito de uma forma aberta, o facilitador e os demais participantes poderão, por consenso, alterar para mais ou para a menos as notas dadas por cada um.

Comentário: Um dia um aluno avaliou que havia utilizado 9 participa na aula de um dia inteiro que estávamos ministrando. Todos começaram a rir, pois ele tinha aberto a boca somente duas ou três vezes durante as 8h de aula. Poucas – mas relevantes – participações poderiam resultar numa grande utilização de participa, mas este não era o caso daquele aluno. Por consenso, a participação dele foi rebaixada para 3. O contrário também ocorre.

O facilitador deverá anotar no papel ou no quadro o nome de cada participante e o total de participa utilizado.

3º passo: O grupo deverá somar a quantidade total de participa utilizados por cada um e depois dividir o número encontrado pelo número de participantes. O resultado final ficará entre 0 e 10.

Uma pontuação alta poderá indicar um grupo com participação mais equilibrada entre as pessoas. Naquele encontro provavelmente terá sido observada uma participação harmônica e cuidadosa dos seus membros, com pouca ou nenhuma sobreposição aos demais e a preocupação de todos com o falar, com o ouvir e a com a inclusão dos participantes.





Ao contrário, uma pontuação baixa poderá significar um grupo com participação desarmônica, indicando uma tendência de polarização, discussão e imposição de pontos de vistas, com sobreposição de um ou poucos sobre os demais, grande desequilíbrio entre a fala e a escuta e pouca ou nenhuma preocupação com a inclusão dos demais.


Quem ganha o jogo?

De acordo com Bohm (2005, p. 34-35), num diálogo “ninguém tenta vencer. Se alguém ganha, todos ganham. Há um espírito diferente. Não há tentativas de ganhar pontos ou de fazer prevalecer visões de mundos individuais. Em lugar disso, sempre que um erro é descoberto por alguém, todo mundo ganha. É uma situação ‘ganha-ganha’ [...]. O diálogo é mais uma participação, na qual não jogamos uns contra os outros, mas com cada um deles. No diálogo, todos vencem”.

No Participâmetro não existe a figura da pessoa ganhadora ou perdedora, mas sim a do grupo com participação equilibrada ou não. Sua meta final é conscientizar as pessoas da importância da sua participação no diálogo. Como é um jogo educativo, pode-se colocar como desafio a melhoria da pontuação final do grupo no próximo encontro.

Comentário: Uma boa dica é pedir aos participantes mais entusiasmados que ajudem os participantes mais tímidos a participarem. E pedir aos mais quietinhos que não deixem escapar a oportunidade preciosa de poder se expressarem. Isto pode ser feito reservadamente ao final da primeira rodada do Paticipâmetro. Pode-se perguntar também aos mais quetinhos a origem do sílêncio: "Diga-me, o que eu poderia melhorar para que você participasse mais?".


Em que momento eu utilizo o Participâmetro?

Sempre que você sentir, num diálogo, a necessidade de educar e promover uma participação mais equilibrada dos seus membros. Por exemplo:
Quando você está num grupo onde uma ou poucas pessoas participam;
Quando uma ou poucas pessoas monopolizam o tempo de fala, prejudicando a participação dos demais;
Quando uma ou mais pessoas, por timidez ou falta de espaço para participação, pouco contribuem para a efetiva troca de idéias.
Comentário: O Participâmetro é uma ótima opção para educar sutilmente uma pessoa que fala muito e sobressai-se aos demais pelas freqüentes intervenções no grupo, muitas vezes sem necessidade. Um dia estávamos ministrando uma aula participativa de três dias numa empresa e a seguinte situação se apresentava ao final do primeiro dia: o gerente falava o tempo todo e os subordinados, acuados, ficavam calados na maior parte do tempo. Era uma situação constrangedora e desafiadora para nós. Como conscientizaríamos aquele gerente da ausência de diálogo no grupo, sem parecer um puxão de orelhas? Utilizamos o Participâmetro no término do primeiro dia e o número final ficou muito, muito baixo. Colocamos como meta aumentar a média do grupo a cada dia, o que acabou acontecendo com sucesso.


Considerações finais

O Participâmetro foi desenvolvido no ano de 2006 como uma metodologia livre para uso, reprodução e alteração. Assim como o talking piece(1), a sua função no grupo é educar e... desaparecer! Ser utilizado somente quando necessário!

Ele tem limitações: não é indicado para mensuração da linguagem não-verbal e talvez não seja a metodologia mais recomendável para utilização em grandes grupos.

Compartilhe conosco as suas experiências e inovações na utilização do Participâmetro pelo e-mailcid.alledi@uol.com.br ou pelos telefones (21) 2671-3116 ou (21) 9433-3636.

Bons diálogos!

Cid Alledi Filho*
cid.alledi@uol.com.br
www.nucleoetico.com.br
Nov. 2006.
Última revisão: Dez. 2007.


(1) Um talking piece é um modo de facilitar um diálogo sem interrupções, que permite uma participação mais igualitária e encoraja uma escuta profunda. Um talking piece pode ser uma pena, uma pedra ou outro objeto que tenha um significado especial para os participantes, sendo passado de pessoa para pessoa num círculo. Quem estiver segurando o talking piece será a única pessoa do grupo convidada a falar. Os demais participantes do círculo serão solicitados a escutar. (BOSTON RESEARCH CENTER, disponível em:www.brc21.org/resources/res_circle.html, acesso em: 05 Set. 07).



Para saber mais sobre o diálogo

ALVES, Rubem. Escutatório. Disponível em: http://www.rubemalves.com.br/escutatorio.htm. Acesso em: 17 Ago. 07.

______. Tênis x Frescobol. Disponível em: http://www.rubemalves.com.br/tenisfrescobol.htm. Acesso em: 11 Ago. 07.

______. A Arte de Ouvir. Disponível em: http://www.rubemalves.com.br/aartedeouvir.htm. Acesso em: 17 Ago. 07.

ART OF HOSTING.  Methods Meets Practise. Disponível em: http://www.artofhosting.org/thepractice/methods/. Acesso em: 20 Mai. 07.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TERAPIA COMUNITÁRIA. Terapia Comunitária. Disponível em:http://www.abratecom.org.br/terapiacomunitaria.asp. Acesso em: 01 Ago. 07.

ASSOCIAÇÃO WARÃ. Warã. Disponível em: http://wara.nativeweb.org/wara.html. Acesso em: 28 Jul. 07.

BALDWIN, Christina. Calling the Circle: the first and future culture. New York: Bantam Books, 1998. 245 p.

BARRETO, Adalberto. Terapia Comunitária Passo a Passo. Fortaleza: Gráfica LCR, 2005.

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BROWN, Juanita; ISAACS, David. The World Café: shaping our futures through conversations that matter. San Francisco, CA: Berrett-Koehler Publishers, 2005. 242 p.

BUBER, Martin. Eu e Tu. 2. Ed. São Paulo: Centauro, 1974. 152 p.

______. Do Diálogo e do Dialógico. São Paulo: Perspectiva, 2007. 176 p.

CORRIGAN, Chris. An Open Space Scenario. Disponível em: http://www.chriscorrigan.com/wiki/pmwiki.php?n=Main.AnOpenSpaceScenario. Acesso em: 10 Ago. 07.

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MARIOTTI, Humberto. O Automatismo Concordo-Discordo e as  Armadilhas do Reducionismo. Fev. 2000. Disponível em: http://www.geocities.com/pluriversu/concdisc.html. Acesso em: 11 Ago. 07.

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OURIQUES, Evandro Vieira (org.). Diálogo Entre as Civilizações: a experiência brasileira. Rio de Janeiro: Centro de Informação das Nações Unidas, 2002. 290 p.

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TAGGI, Max; BIZI, Marisa. A Arte do Diálogo. Bauru, SP: EDUSC, 1999. 104 p. Tradução de: L’arte del Dialogo.

THE WORLD CAFÉ. Café to Go! (Café para Viagem): um guia simplificado para auxiliar os diálogos durante um World Café...  Whole System Associates, 2002. Disponível em:http://www.theworldcafe.com/translations/World_Cafe_Para_Viagem.pdf. Acesso em: 10 Jul. 07. 8 p.

*Cid Alledi Filho é professor de disciplinas ligadas à promoção do diálogo, ética nos negócios, transparência, responsabilidade social e sustentabilidade no LATEC/UFF, UNICAMP, UniEthos e Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, dentre outras organizações.

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TERAPIA COMUNITÁRIA: entre nesta roda


Terapia Comunitária é um instrumento que nos permite construir redes sociais solidárias de promoção da vida e mobilizar os recursos e as competências dos indivíduos, das famílias e das comunidades. Procura suscitar a dimensão terapêutica do próprio grupo valorizando a herança c ultural dos nossos antepassados indígenas, africanos, europeus e orientais, bem como o saber produzido pela experiência de vida de cada um.
A
É essa diversidade cultural que faz a grandeza deste País. Possibilitar a cada um agregar novos valores, é uma riqueza inestimável no processo de "empoderamento" e na construção da cidadania.
Prevenir é, sobretudo, estimular o grupo a usar sua criatividade e construir seu presente e seu futuro a partir de seus próprios recursos. A TC nos convida a uma mudança de olhar, de enfoque, sem querer desqualificar as contribuições de outras abordagens, mas ampliar seu ângulo de ação. Vejamos: 1.. Ir além do unitário para atin
Enquanto muitos modelos centram suas atenções na patologia, nas relações individuais, privadas, a TC se propõe cuidar da saúde comunitária em espaços públicos. Propõe-se a valorizar a prevenção
.gir o comunitário. Com a globalização, surgiram novos desafios: drogas, estresse, violência, conflitos, insegurança, e a superação desses problemas já não pode ser mais obra exclusiva de um indivíduo, de um especialista, de um líder, e sim da coletividade. A própria comunidade que tem problemas, dispõe também de soluções e, por conseqüência, torna-se instância terapêutica no tratamento e prevenção de seus males.
tência: o sofrimento vivenciado é uma grande fonte geradora de competência, que precisa ser valorizado e resgatado na própria comunidade, como uma forma de reconhecer o saber construído pela vida. Poder mobilizá-los no sentido da promoção de vínculos solidários é uma forma de consolidar a rede de apoio aos que vivem situações de conflitos e sofrimento psíquico. 4.. Sai
2.. Sair da dependência para a autonomia e a co-responsabilidade: modelos que geram dependência são entraves a todo desenvolvimento pessoal e comunitário. Estimular a autonomia é uma forma de estimular o crescimento pessoal e o desenvolvimento familiar e comunitário. A consciência de que as soluções para os problemas provêm da própria comunidade reforça a autoconfiança.
3.. Ver além da carência para ressaltar a comp
er da verticalidade das relações para a horizontalidade. Esta circularidade deve permitir acolher, reconhecer e dar o suporte necessário a quem vive situações de sofrimento. Isso proporciona maior humanização das relações.
dos outros, sem negarmos a contribuição da ciência.
5.. Da descrença na capacidade do outro para acreditar no potencial de cada um. O aprender coletivamente gera uma dinâmica de inclusão e empoderamento. Precisamos deixar de apenas pedir a adesão do outro às nossas propostas, para podermos estar a serviço das competências
ão. Ambos tiram benefícios. A comunidade gerando autonomia e inserção social e os profissionais se curando de seu "autismo institucional e profissional", bem como de sua alienação universitária. 7.. Romper com o clientelismo para chegarmos a cidadania: o indivíduo deixa de ser objeto passivo de intervenção para se tornar num parceiro ativo e sujeito de sua história. 8.. Romper com o isolamento entre o "saber científico" e o "saber popular", fazendo um esforço no sentido de se exigir um respeito mútuo entre as duas formas de saber, numa perspectiva complementar, sem rupturas com a tradição e sem negar as contribuições da ciência moderna. 9.. Romper com o modelo que concentra a informação para fazê-la circular. Resgatar o capital so
6.. Ir além do privado para o público: A reflexão dos problemas sociais que atingem os indivíduos sai do campo privado para a partilha pública, coletiva, comunitária. A ênfase no trabalho de grupo, para que juntos partilhem problemas e soluções e possam funcionar como escudo protetor para os mais vulneráveis, são instrumentos de agregação e inserção social. Nós afirmamos que a solução está no coletivo e em suas interações, no compartilhar, nas identificações com o outro, no respeito às diferenças. Os profissionais devem ser parte desta constru
çciocultural do grupo e torná-los co-autores das decisões e das políticas sociais.
TC nasceu no Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC. Há 18 anos, este modelo tem sido desenvolvido pelo prof. Dr. Adalberto
ABarreto da UFC. Já foram formados pela Universidade Federal do Ceará, cerca de 7.000 terapeutas comunitários atuando em 23 estados brasileiros.
(*)email
ite: www.projeto4varas.com
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DIÁLOGO: UM MÉTODO DE REFLEXÃO CONJUNTA E OBSERVAÇÃO COMPARTILHADA DA EXPERIÊNCIA* Humberto Mariotti **



Introdução O diálogo, tal como entendido neste texto, é um  método de conversação que busca os seguintes resultados: a) melhoria da comunicação entre os interlocutores; b) observação compartilhada da experiência; c) produção de percepções e idéias novas. O diálogo amplia a percepção cooperativa do real. Sua marca fundamental é, pois, a fertilização mútua. 


A proposta não inclui chegar a sínteses nem tomar decisões; estas são as finalidades da discussão e do debate. Na interação do diálogo, o propósito é exercitar novos modos de ver e criar significados em conjunto. Por esse motivo, a denominação “diálogo” é até certo ponto inadequada. Em nossa cultura, aquilo que conhecemos com esse nome são interações verbais em que os participantes defendem posições, argumentam, negociam e, eventualmente, chegam a conclusões ou acordos. 


O método do diálogo, como acabamos de ver, não busca nada disso. No entanto, o termo “diálogo” já está consagrado pelo uso. É necessário, portanto, buscar formas de atenuar as confusões e equívocos derivados dessa inadequação. O ideal seria abandonar a palavra “diálogo” e substituí-la por outra, mas já sabemos que isso não é mais viável. Por essa razão, proponho que sempre que a utilizemos — no sentido em que é considerada neste texto — ela seja complementada pela explicação de que o diálogo é uma atividade cooperativa de reflexão e observação da experiência vivida.
Definição
Diante do exposto, proponho a seguinte definição: diálogo (reflexão conjunta e observação cooperativa da experiência) é um método de conversação que busca melhorar a comunicação entre as pessoas e a produção de idéias novas e significados compartilhados. É um método que permite que as pessoas pensem juntas e compartilhem os dados que surgem dessa interação, sem procurar analisá-los ou julgá-los de imediato.

O método se opõe à fragmentação, ao imediatismo e à super-simplificação — três das características fundamentais do modelo mental que condiciona a nossa cultura. Esse condicionamento é milenar e se acentuou nos últimos três séculos. É como se estivesse gravado a ferro em brasa em nossa mente, de tal modo que na prática se tornou o único meio pelo qual percebemos o mundo, interagimos com ele e tentamos entendê-lo. É por meio desse padrão que a ciência e a tecnologia (e, por extensão, toda a nossa cultura) lidam com os fenômenos naturais e culturais e buscam compreendê-los e explicá-los. Isso significa que todos os nossos pressupostos, todas as nossas “certezas”, todas as nossas teorias a respeito do mundo, são formatadas por esse modo de pensar.

Os pressupostos fundamentais desse modelo sustentam que: a) a maneira mais adequada de examinar um objeto ou situação é fragmentá-los e estudar as partes em separado, para depois tentar reunir os resultados da investigação numa síntese; b) as causas são sempre imediatamente anteriores aos efeitos ou estão muito próximas deles; c) a seqüência causa-efeito ocorre sempre num mesmo contexto de espaço e tempo;  d) o mundo é visto de forma binária, pelo padrão ou/ou: ou bem ou mal; ou certo ou errado; ou real ou imaginário; ou vencedor ou vencido; e assim por diante; e) tendência à quantificação e à objetividade; f) dificuldade de lidar com a subjetividade (sentimentos, intuição, emoções) e com a dimensão qualitativa da vida.

Como já foi demonstrado em muitos estudos, a fragmentação e a super-simplificação não raro têm produzido graves conseqüências. As imensas dificuldades de comunicação entre as pessoas e as instituições que elas criaram (a família, a escola, os governos, as empresas, as culturas, enfim) são alguns exemplos. O mesmo é válido para os fracassos quase que invariáveis dos esforços diplomáticos e das intermináveis conversações de paz que proliferam nos noticiários.

A principal peculiaridade desse nosso condicionamento é desalentadora: a experiência tem mostrado que quanto mais claro fica que estamos marcando passo, mais insistimos em não mudar nosso modo de pensar; quando mais óbvio se torna que estamos num processo de repetição dos mesmos erros, mais incapazes nos tornamos de perceber essa obviedade. Albert Einstein definiu essa situação em duas frases bem conhecidas: a) “nenhum problema pode ser resolvido pelo mesmo estado de consciência que o criou”; b) “tudo mudou, menos o nosso modo de pensar”.

O automatismo concordo-discordo
Nossa tendência a fragmentar é mais forte que a necessidade de integrar. Não sabemos ouvir. Quando alguém nos fala, em vez de escutar até o fim o que ele tem a dizer, logo começamos a comparar o que é dito com nossas idéias e referenciais prévios. Esse processo mental — que chamo de automatismo concordo-discordo — quando levado a extremos é muito limitante. Ouvir até o fim, sem concordar nem discordar, é muito difícil para todos nós. Não sabemos como lidar — mesmo de modo temporário — com o pouco conhecido ou o desconhecido.

O automatismo concordo-discordo funciona assim: quando nosso interlocutor começa a falar, de imediato assumimos duas atitudes: a) “já sei o que ele vai dizer e concordo; portanto, não vou perder tempo a ouvi-lo”; b) “já sei o que ele vai dizer e discordo; assim, não tenho por que ouvi-lo até o fim”. Em ambos os casos o resultado é o mesmo: negamos a quem nos fala a capacidade ou a possibilidade de dizer algo de novo — o que na prática pode corresponder à negação da existência dessa pessoa.

Faça você mesmo a prova: tente escutar até o fim, sem concordar nem discordar, o que o seu interlocutor lhe diz. Procure evitar que, logo às primeiras frases dele, você já esteja pensando no que irá responder. Verá então como é difícil. E constatará que esse automatismo é uma das manifestações mais poderosas do condicionamento de nossa mente pelo modelo mental "ou/ou" — a lógica binária.

Eis o principal objetivo do diálogo: lidar com o automatismo concordo-discordo. Tentar atenuar os nossos condicionamentos, buscar alternativas à atitude habitual. Destas observações, pode-se deduzir a principal utilidade do método dialógico: perceber e pensar as mesmas questões de modo diferente, a fim de que daí possam emergir idéias novas. Num segundo momento (ou seja, já por meio da discussão e do debate) estas poderão ser avaliadas, julgadas, o que pode resultar na implementação de ações não-repetitivas, diferentes das rotineiras.

O questionamento básico do diálogo é simples e pode ser assim enunciado: “E se suspendermos — ao menos de modo temporário — as nossas ‘certezas’, e conversarmos fora de sua influência para ver o que acontece?” Ou, posto de outra forma: mudar o modo de olhar, modificar a perspectiva, observar a partir de outros ângulos, pensar os mesmos problemas de modo diferente. Conclui-se, então, que o método se aplica a qualquer contexto no qual seja necessário produzir idéias não-rotineiras e aprender em grupo. Ele é útil em todos os âmbitos e oportunidades em que se torna necessário mudar o modo habitual de perceber o mundo. A área educacional e o universo das empresas são dois desses domínios. Com efeito, em muitas organizações de vários países do mundo o método do diálogo é utilizado nesse sentido.

Origens
A palavra “diálogo” resulta da fusão das palavras gregas dia logos. Dia significa “por meio de”. Logosfoi traduzida para o latim ratio (razão) mas tem vários outros significados, como “palavra”, “expressão”, “fala”, “verbo”. Dessa maneira, o diálogo é uma forma de fazer circular sentidos e significados. Num grupo que dialoga, as palavras circulam entre as pessoas, passam através delas sem que sejam necessárias concordâncias, discordâncias, análises ou juízos de valor. As palavras — e o que elas significam — são observadas tal como se apresentam à experiência imediata dos participantes.

Isso quer dizer que na experiência do diálogo a palavra liga, permeia, em vez de separar. Aglutina em vez de fragmentar. Essa noção nos leva a concluir que a interação dialógica não é um instrumento que permite que as pessoas defendam e mantenham suas posições, tal como acontece na discussão e no debate. A dinâmica do diálogo está voltada para ligações, para a formação de redes. Daí o nome de “redes de conversação”, proposto para as experiências de reflexão conjunta, geração de idéias, educação mútua e produção compartilhada de significados.

Objetivos do diálogo e dinâmica da conversação
Segundo o físico David Bohm, estes são os principais objetivos de um grupo que utiliza a interação dialógica: a) melhorar a comunicação entre as pessoas; b) observar o processo do pensamento (ou seja, observar a dinâmica da mente de um modo prático e disciplinado); c) construir de micro-culturas por meio da criação de redes de conversação; d) produção e compartilhamento de significados.

De um modo geral — e para fins didáticos —, a seqüência dos fenômenos que ocorrem numa conversação pode ser exposta da seguinte forma: a) as pessoas falam; b) as diferenças emergem; c) fica claro, então, que é necessário fazer escolhas. Estas podem ser orientadas para dois caminhos: 1) discussão controlada, que, caso as posições se acirrem, transforma-se em debate; 2) diálogo.

O diálogo é diferente da discussão/debate que, como vimos, é uma forma de negociação que implica a exclusão das idéias “vencidas”. Ao negociar, os interlocutores trabalham no sentido de ganhar algo, embora nesse esforço possam ter de ceder um pouco daquilo que pretendiam ganhar. Depois de uma discussão/debate há uma conclusão — pelo menos é isso que se deseja. No diálogo não se visa concluir, chegar a um resultado único, nem nada equivalente. Tudo o que se quer é fazer emergir idéias e significados novos e compartilhá-los.

Abaixo, as principais diferenças entre o diálogo e a discussão/debate.
Objetivos do método do diálogo-Abrir questões.
-Mostrar.
-Estabelecer relações.
-Compartilhar idéias.

-Questionar e aprender.
-Compreender.
-Ver as relações entre as partes e o todoo.
-Fazer emergir idéias
-Revelar a pluralidade das idéias

Objetivos da discussão/debate
-Fechar questões.
-Convencer.
-
Demarcar posições.
-Defender idéias.
-Persuadir e ensinar.
-Explicar.
-Examinar as partes em separado.
-Descartar as idéias vencidas".
-Fazer acordos.

Cabem aqui algumas observações a respeito dessas diferenças. Em primeiro lugar, elas não pretendem afirmar que o diálogo é melhor ou pior do que a discussão e o debate. Trata-se de maneiras diferentes — porém complementares — de conversar. E é bom que assim seja, pois há situações na vida em que precisamos dialogar e circunstâncias nas quais precisamos discutir e debater.

Além disso, na prática a separação entre uma coluna e a outra não é tão estanque assim. Numa sessão de diálogo, as pessoas muitas vezes passam da discussão/debate à interação dialógica e vice-versa. É muito importante, pois, evitar o esquematicismo, que aqui é utilizado apenas com objetivos didáticos.

Em outros termos: há instantes em que precisamos utilizar o modelo mental fragmentador (útil para a discussão e o debate) e momentos em que precisamos utilizar um modelo de pensamento abrangente (útil para o diálogo). No primeiro caso, trata-se das circunstâncias práticas da vida mecânica, em que precisamos lidar com fenômenos objetivamente observáveis, com quantidades e com as partes em separado. No segundo caso trata-se de situações da vida não-mecânica. Nelas é necessário pensar de modo global, lidar com sentimentos, emoções e intuição. São ocasiões em que é necessário compreender a interação entre o todo e as partes.

Ao contrário do que acontece na discussão/debate, no diálogo não existe o pingue-pongue de perguntas e respostas. O ânimo das pessoas que dialogam não é a atitude costumeira da nossa cultura litigante, na qual nada deve ser deixado sem réplica e competimos para ficar com a última palavra, isto é, para “ganhar”. Numa sessão de diálogo, quem fala não deve esperar sempre uma resposta — que seria como uma reação à sua fala —, mas sim as percepções e idéias que esta faz surgir nos interlocutores.

Dessa forma, não se trata de responder ao que foi dito pelo outro. Mas, sim, falar complementando ou acompanhando o que ele disse. Trata-se de produzir algo que não existia antes em cada interlocutor e que surge como propriedade emergente ao longo da relação. Alguma coisa é produzida — algo que não existia nos interlocutores em separado a não ser em estado latente. No diálogo, o padrão “eu falo, você responde” é substituído pela alternativa “eu falo, você também fala; falamos juntos”. As idéias novas surgem por meio da cooperação, não pelo confronto.

No diálogo não há enfrentamento ou competição. Existem interações, ligações interpessoais. A expressão gráfica da discussão/debate poderia ser assim: -> <-. Já para o diálogo ela seria uma circularidade. Num caso a relação é linear. No outro é sistêmica. A finalidade do diálogo é observar e participar para aprender pela compreensão. O objetivo da discussão/debate é participar e intervir para aprender pela explicação. Por isso, pode-se dizer que no diálogo a postura observadora é o princípio, o meio e o fim. Mas é indispensável ter em mente que a observação dialógica é participante: observo, mas ao mesmo tempo me observo como observador; faço parte daquilo que observo.

Não existe um padrão de comportamento ideal para o diálogo. Como veremos adiante, as (poucas) regras do método dialógico são apenas operacionais. Além disso não podem ser tomadas como normas rígidas, pois isso quebraria a naturalidade do processo. Não nos esqueçamos de que o compromisso básico de quem entra em um grupo de diálogo é suspender a atitude habitual, ou seja, procurar afastar a rigidez dos condicionamentos.

Vimos que numa sessão de diálogo às vezes a conversação é entremeada de momentos de discussão e debate e/ou tentativas de interpretação/explicação. Tal circunstância costuma incomodar alguns dos participantes, que se autocensuram e censuram os companheiros de grupo por não cumprir “as regras”. Por outro lado, as pessoas muitas vezes perguntam: “Como saber se estamos ou não em diálogo?” Essa indagação, além de não ter maior significado prático, é ela própria um pressuposto: o de que é preciso seguir à risca as normas. Indica que as pessoas acham que quando dialogam é imperioso dialogar e nada mais.

Todas essas eventualidades tendem a desvirtuar a proposta dialógica, pois podem levar ao modelo fragmentador: ou discussão ou diálogo. Nesses casos, a suspensão de pressupostos torna-se em si mesma um pressuposto, o que gera dúvidas, tensão e ansiedade. Na verdade nada disso é necessário: se o diálogo e a discussão/debate são complementares, é claro ambas as duas formas podem surgir durante uma reunião.

A atitude de sempre comparar, checar, controlar, julgar — própria do condicionamento básico de nossa cultura —, tende a dificultar ou mesmo impedir o diálogo. Nossos condicionamentos nos levam a utilizar a discussão e o debate quando eles são necessários e eficazes — mas usá-los também nas situações em que são desnecessários e ineficazes. O diálogo tornou-se um meio de comunicação relegado ao segundo plano, quando não de todo desprezado. É preciso, pois, reaprender essa arte esquecida. Foi essa a iniciativa tomada por autores como o educador Jiddu Krishnamurti, o filósofo Martin Buber, o físico David Bohm e o psicoterapeuta Patrick de Mare, entre outros.

Contudo é importante lembrar que, no Ocidente, o introdutor da filosofia em que se baseia o método do diálogo foi Edmund Husserl (1859-1938). Sua proposta fundamental era a suspensão de pressupostos, idéias prévias, teorias, seguida da observação dos fenômenos tal como eles se apresentam à experiência imediata. Essa postura está expressa na famosa frase de Husserl: “Voltar às coisas mesmas”.

À sua filosofia Husserl chamou de fenomenologia. À suspensão de pressupostos, ele denominou de "suspensão da atitude natural" (que prefiro chamar de atitude habitual) ou "redução fenomenológica". Dessa forma deve-se reconhecer que Husserl — ao menos em termos ocidentais — talvez seja o principal precursor da atitude dialógica. Do mesmo modo que, em termos de investigação da mente, ele é hoje reconhecido como um dos precursores da ciência cognitiva.

Abertura para idéias novas
Nossa mentalidade utilitarista e instrumental faz com que esperemos que nos sejam sempre fornecidos produtos e/ou ferramentas para uso imediato. É claro que tal expectativa pode ser também aplicada ao diálogo, que no entanto não é uma ferramenta pois somos partes dele. Em geral não existe, em nossa cultura, a preocupação de aprender pelo relacionamento com o mundo e com os outros. Esperamos que tudo venha de fora já pronto sob a forma de teorias, regras, normas, instruções de uso que nos digam o que pode e o que não pode ser feito e como fazê-lo. No diálogo, porém — com exceção de algumas atitudes básicas —, não há “modos de usar”. Existe a consciência de que as pessoas não são coisas nem instrumentos. O que há são modos de participar e compreender.

Na postura dialógica não há lugar para a idéia de que as pessoas devem se colocar como comandados à espera de ordens e regras sobre como viver suas experiências. Para muitos tal postura parece cômoda, simples, rápida. Sobretudo, tem a virtude de dispensá-los do esforço de pensar. No diálogo não há nada disso. Ele não se apresenta como um remédio, terapia, nem muito menos como uma ferramenta para resolução de problemas.

Outro pressuposto bem conhecido de nossa cultura é a separação sujeito-objeto. Por meio dele, julgamo-nos separados do mundo e independentes uns dos outros. No processo dialógico suspendemos temporariamente as nossas crenças. Ao fazer isso damos um passo importante para identificar e, nos casos necessários, suspender ao menos por alguns momentos a idéia de que somos separados do mundo em que vivemos, isto é, de que o ser humano é separado da natureza.

Nossa mentalidade instrumental nos levou a muitas esperanças falsas. Talvez a principal delas seja a de que as ferramentas, as técnicas, as terapias, etc., estão à nossa disposição para fazer o “trabalho duro”, enquanto descansamos e nos divertimos. Tudo isso potencializa nossas fantasias, mas leva com freqüência a decepções.

É o que acontece todas as vezes que descobrimos que nossa vida depende de nós mesmos. Por outro lado, isso não nos dispensa de cooperar com os outros e vice-versa. A vida depende do que criamos em comum, mas cada um deve assumir a responsabilidade pelo que construiu. Somos ao mesmo tempo autônomos e dependentes. O diálogo é um dos meios pelos quais essa condição se torna clara.

O silêncio no diálogo
O indivíduo que opta por longos períodos em silêncio, enquanto participa de um grupo de diálogo, está dialogando? Quando o grupo entra em silêncios prolongados pode-se dizer que existe diálogo? A resposta é simples: dialogar é antes de mais nada aprender a ouvir. O outro precisa ser ouvido até o fim sem que o interrompamos, seja para concordar ou discordar.

Enquanto ouvimos, é importante ter consciência do que sentimos. É preciso que estejamos atentos às nossas reações ao que ouvimos. A comunicação é determinada pela percepção de quem a recebe, e não pelo que é expresso por quem comunica. O silêncio — individual ou coletivo — também faz parte do diálogo. É importante perceber aquilo que a fala (ou o silêncio) do outro produz em nós: impaciência? Inquietação? Desconfortos em determinadas partes do corpo? Alterações no ritmo cardíaco e na respiração? Aborrecimento? Ansiedade? O que mais?

Não que o conteúdo do que nos dizem não tenha importância. O que quero destacar é que a comunicação provoca em nós um impacto global e não apenas intelectual. Por isso, é preciso que estejamos atentos à totalidade de nossa estrutura enquanto ouvimos. É preciso ouvir até o fim, sem concordar nem discordar. Ou compartilhar o silêncio, se for o caso. Observar, deixar-nos permear pelo que ouvimos. Não tentar logo de saída analisar, explicar, classificar, ou por qualquer outro meio racionalizar. Praticar a auto-observação (não a auto-análise ou a auto-explicação) enquanto escutamos. Essa é uma postura que por si só implica um grau importante de suspensão de pressupostos. É o que o filósofo Martin Heidegger chamava de "relação aberta com o mundo".

Foi dito que as posturas básicas do diálogo são relativamente poucas. Já sabemos que sua essência corresponde à atitude fenomenológica proposta por Husserl, que pode ser resumida nos seguintes itens: a) prestar atenção aos fenômenos quando e como eles se mostram; b) descrevê-los sem tentar explicá-los; c) respeitar as diferenças; d) não se deixar influenciar por pressupostos e crenças; e) pôr todos os fenômenos em pé de igualdade; f) não delimitar logo de saída o campo de observação; g) ver-se como participante, não como observador.


A suspensão de pressupostos
Os pressupostos são nossas crenças arraigadas, nossas teorias sobre como o mundo deve ser, nossas “certezas”. Aqui se incluem também os nossos preconceitos. Apesar de serem úteis em casos específicos, em muitas circunstâncias os pressupostos “engessam” a nossa mente de tal maneira que podem estreitar e obscurecer nossa visão de mundo. Correspondem aos “já sei do que se trata”, “isso não é novidade” e assim por diante. Lembremos um conhecido pressuposto que prejudicou e ainda prejudica a aprendizagem de incontáveis alunos: “A matemática é complicada e incompreensível”. Essa “certeza” tem fechado o horizonte mental de muitas pessoas para o aprendizado dessa disciplina.

Por meio dos pressupostos, ficamos convencidos de que já “sabemos” tudo sobre uma determinada pessoa, situação ou assunto. Convencemo-nos de que não há mais nada a aprender. Sempre que nos defrontamos com uma idéia ou situação nova, nossa tendência é compará-la de imediato com nossos referenciais, isto é, tentar enquadrá-las neles, reduzi-las a eles. Assim, é fácil deduzir que quanto mais nos agarramos a crenças mais nossa percepção e compreensão se estreitam e se tornam obscuras. A fixação em determinadas idéias constitui o principal motivo de nossa resistência ao novo e à mudança. Fecham portas e obstruem caminhos. Se pudermos suspendê-las — ainda que temporariamente —, um mundo novo se abrirá diante de nossa percepção e perspectivas novas se tornarão possíveis.

Entretanto, resta saber: a) é possível, na prática, fazer essa suspensão?; b) em caso afirmativo, como fazê-la? A resposta à primeira questão é positiva, mas é preciso esclarecer o que significa  suspender crenças. Essa noção, por sua vez, nos dará elementos para  responder à segunda questão. O filósofo francês Michel de Montaigne (1553-1592) já falava sobre isso, quando se referia à “suspensão do juízo”. Ele observou que suspender não significa eliminar em definitivo. Significa apenas não julgar por algum tempo até que se tenha uma percepção melhor da pessoa, conceito ou situação. Ou seja: deixar para fazer os julgamentos um pouco mais tarde, quando for o caso. Enfim, manter a mente aberta à experiência.

Referenciais importantes
Os pontos abaixo são cruciais para o diálogo como instrumento de busca de idéias novas e, portanto, de conhecimento e aprendizagem. Por isso, precisam ser relembrados:
1. O principal obstáculo ao diálogo é que as pessoas quase sempre definem o seu comportamento com base em referenciais que consideram consolidados. Estes constituem o principal bloqueio à abertura mental e ao aprendizado. É o que podemos chamar de atitude habitual.
2. Essa atitude é a principal manifestação do modelo mental fragmentador que formata a nossa cultura. Suas características básicas são: a) visão de mundo voltada mais para fora, isto é, a busca constante da objetividade, como se o conhecimento pudesse ser só objetivo; b) o conseqüente desprestígio da subjetividade e da qualidade, que são vistas como maneiras “inferiores” de conhecer; c) pensar quase sempre em termos de causalidade imediata.

O aprendizado eficaz depende do modo como aprendemos a questionar nossas idéias prévias. Como resultado, poderemos chegar à abertura mental necessária à diminuição da resistência à mudança. A atitude habitual pode se transformar em uma posição defensiva. É ela que faz com que a maioria de nós assuma uma posição resistente sempre que postos diante de idéias novas. Para diminuir essa resistência, como já vimos, é preciso aprender a suspender tal postura.

A suspensão nos leva a uma visão de mundo mais abrangente. Esta, por sua vez, mostra que o conhecimento não é só objetivo nem apenas subjetivo: é o resultado da interação entre o observador e o observado. Por isso, lidar com ele implica que as pessoas aprendam a lidar também com sua subjetividade, isto é, com o modo como vêem o mundo e como essa visão gera comportamentos.

Se aprendermos a suspender a atitude habitual, serão removidas, ao menos em parte, as defesas que entravam esse aprendizado. Ao agir de modo defensivo imaginamos que nos protegemos, quando na verdade perdemos eficácia perceptiva e estreitamos nossa compreensão. A principal característica da atitude defensiva é a recusa à auto-observação e ao auto-questionamento, com a conseqüente criação do hábito de atribuir as causas de nossos problemas a fatores externos.

Nessa situação, sempre que confrontados com o fato de estarmos na defensiva nos tornaremos ainda mais defensivos. Entraremos num beco sem saída. Se as pessoas não tomarem consciência de como muitas vezes raciocinam de maneira defensiva — e de que é necessário suspender a atitude habitual para evitar isso —, qualquer tentativa de mudança de modelo mental dificilmente será bem sucedida. Por isso a suspensão da atitude habitual não é um sinal de fraqueza ou de falta de persistência, como muitas vezes se pensa, mas sim uma demonstração de abertura e senso de realidade. Ela pode ser difícil, mas seus resultados valem a pena.

Talvez as noções mais importantes sobre a suspensão dos pressupostos sejam estas: a) a suspensão é temporária; b) limita-se ao tempo de duração do diálogo e ao assunto em pauta. Para David Bohm, ela começa com a observação. Na metáfora desse autor, durante o diálogo os pressupostos devem ficar suspensos à nossa frente como se estivessem pendurados num fio invisível — como roupas num varal. Isso quer dizer que antes de proceder à sua suspensão é preciso identificá-los e expô-los, não apenas a nós próprios mas também aos nossos interlocutores.

É como colocá-los no centro do círculo que dialoga. Apresentá-los e tentar compreendê-los, e não analisá-los, questioná-los nem explicá-los. A esse respeito, a conhecida frase de Espinosa é ilustrativa: “Não rir, não lamentar, não odiar, mas sim compreender”. Ao proceder dessa maneira, permitimos a nós mesmos e aos nossos interlocutores examinar as crenças a partir de perspectivas novas e diversificadas perspectivas. Olhá-las de outras maneiras, enfim. É importante que esse procedimento seja bem compreendido, porque ele constitui a própria essência do diálogo.

A reflexão coletiva é muito importante. Há muito se sabe que os outros conhecem bem melhor que nós os nossos pressupostos. Ao localizá-los e expô-los, reconhecemos esse fato e permitimos que as pessoas nos dêem retorno a respeito de nossas “verdades”. Ao proceder assim, pedimos-lhes que nos ajudem a superar algumas de nossas limitações.

Dialogar, portanto, é pôr-se  à prova, o que não é fácil. Os resultados, porém, são compensadores. A posição dialógica é uma troca de impressões, um compartilhamento de idéias ou significados que surgem à medida que as pessoas conversam. É comum que elas produzam frases assim: “O que você acabou de dizer me faz lembrar que...”, ou semelhantes, e a partir daí se desenrole toda uma dinâmica de criatividade.

Interações dessa espécie geram idéias novas. Produzem sinergias. Pode-se dizer que elas põem em prática um princípio básico do pensamento sistêmico: num sistema o mais importante não são as partes isoladas, mas sim o modo como elas interagem e fazem surgir propriedades novas (propriedades emergentes), que não existiam — ou só existiam em estado latente — nas pessoas isoladas.

As propriedades emergentes surgem em resposta ao convite implícito em todo diálogo: cada participante convida os demais a ajudá-lo a perceber que não consegue aprender sozinho, pois suas “certezas” o impedem de fazê-lo. Posições diferentes das nossas não devem provocar rejeição nem contestação. Ao contrário, precisamos aproximar-nos delas, conhecê-las, observar as modificações que elas produzem em nossa estrutura.

Há dois modos principais de lidar com a diversidade. O primeiro consiste em tentar superá-la, ou, se isso não for possível, afastá-la. É o modo representacionista, que afirma que o mundo é pré-dado em relação à nossa experiência e que portanto todos devemos percebê-lo da mesma maneira. Criam-se assim visões padronizadas.

O outro modo é o construtivista, que sustenta que o mundo em que vivemos é o que construímos ao longo de nossas interações com ele. Para tanto, é preciso aprender a conviver com a diversidade. Sob esse ponto de vista, o diálogo é um exemplo de construtivismo levado à prática. A emergência de significados e seu compartilhamento geram novos modos de comportamento: constituem a matéria-prima da construção das microculturas grupais.

O diálogo é mais um modismo?
Eis uma pergunta que as pessoas fazem com freqüência, em especial no âmbito das empresas, no qual os chamados “modismos gerenciais” proliferam com rapidez. Por essa razão, justificam-se alguns esclarecimentos. Proponho alguns critérios, que talvez que nos capacitem a saber com um razoável grau de aproximação quando estamos diante de um modismo.

Ei-los: a) promessa de aprendizado rápido; b) promessa de resultados imediatos ou a curto prazo; c) visão quantitativa e financeira; d) promessa de tornar as pessoas “mais competitivas”, por meio da aquisição de certas “habilidades” e “poderes”; e) a pouca ou nenhuma importância dada às relações interpessoais; f) a pouca ou nenhuma importância dada às emoções e sentimentos.

É claro que o leitor também pode, recorrendo à sua própria experiência (e talvez recordando as decepções que já teve com um ou mais desses métodos “miraculosos”), aumentar a lista acima. De todo modo, ela se propõe a ser um auxílio àqueles que precisam lidar com os modismos.

Se aplicarmos esses critérios ao diálogo, os resultados serão: a) o método não é fácil de aprender; b) não há promessa de resultados imediatos; c) a visão é mais qualitativa; d) o objetivo não é aumentar a “competitividade” das pessoas nem dar-lhes poderes “mágicos”; e) as relações interpessoais são o ponto central; f) dá-se importância às emoções e sentimentos, sem no entanto negar a racionalidade e a praticidade.

Mais uma vez, é necessário lembrar que o diálogo não se propõe a ser algo “bom” e “correto”, cujo objetivo é ocupar o lugar de práticas “más” e “incorretas”. Ao contrário, sua finalidade é evitar esse e outros tipos de polarização. Tudo isso visto, o leitor está convidado a tirar suas próprias conclusões.

O diálogo é mais um conjunto de "receitas prontas"?
Há quem imagine que o diálogo não tem metodologia, que seja algo apenas intuitivo. Trata-se de um equívoco. Há muito de intuitivo em sua prática, é claro, mas existem outros aspectos a serem observados.

Ao falar sobre a evolução das espécies, o cientista chileno Francisco Varela se referiu a dois tipos de jogo. No primeiro (que para ele é o que ocorre no mundo natural), uma vez cumpridos certos requisitos básicos o resto corre por conta da interação dos sistemas vivos com o meio. O segundo tipo se pode ser definido pela diretiva: “Eis o que deve ser feito; tudo mais é proibido”. O primeiro jogo é libertário, o segundo é determinístico, regulamentado.

O diálogo é um jogo do primeiro tipo. Prevê algumas normas iniciais, mas daí em diante tudo depende dos participantes. Portanto, não se deve confundir normas operacionais com receitas. Do mesmo modo que o exagero do uso de métodos e técnicas pode se transformar em obstáculos, a ausência de metodologia pode levar ao mesmo resultado.

Assim, o que se segue deve ser visto como um conjunto de sugestões a serem aplicadas e desenvolvidas de modo ativo: a) ouvir para aprender algo de novo e não para conferir com crenças prévias; b) respeitar as diferenças e a diversidade; c) refletir sem julgar; d) ter sempre em mente que o objetivo é criar e aprender, e não “ter razão” e sair vencedor. As pessoas que não compreendem o que é suspensão de idéias preconcebidas, ou que necessitam de explicações, regras, normas e diretrizes detalhadas para suspendê-las, dificilmente conseguirão dialogar.

A suspensão de pressupostos deve ser uma atitude consciente e pragmática. Não há mágicas nem aspectos miraculosos em sua realização. Também não se trata de suspender todos os pressupostos a respeito de tudo e para sempre. Tal coisa seria impossível e, mesmo que fosse possível, seria desnecessária para a prática do método do diálogo. Nunca é demais insistir que o objetivo é suspender, durante a duração do diálogo, idéias prévias sobre o assunto que está sendo tratado.

Por fim, eis mais algumas considerações que têm sido úteis em minha experiência com grupos:

  1. A mente faz parte do cérebro; o cérebro faz parte do corpo; o corpo faz parte do mundo; logo, a mente não é separada do mundo.

  2. A realidade de um indivíduo é a visão de mundo que sua estrutura lhe permite perceber num dado momento. A estrutura muda sempre, de modo que essa compreensão, que num dado instante parece fora de dúvida e definitiva, pode não sê-lo mais tarde.

  3. Enquanto permanecer apenas individual, qualquer compreensão de mundo será precária. Por isso, é preciso ampliá-la.

  4. Com quanto mais pessoas conversarmos sobre nossas percepções e compreensões, melhor. Quanto maior a diversidade de pontos de vista dessas pessoas, melhor ainda.

  5. Se uma conversa produzir em nós tendência a achar que não ouvimos nada de novo, é bem provável que estejamos na defensiva.

  6. É importante dar atenção aos pontos de vista dos quais mais discordamos e aos comportamentos que mais nos irritam. Mas isso não quer dizer que estejamos obrigados a aceitar tudo ou a concordar com tudo: significa que o contato com a diversidade é fundamental para a aprendizagem e para a abertura de nossa mente.

  7. Do mesmo modo, é importante dar a mesma atenção (no sentido de avaliar sempre) aos pontos de vista com os quais mais concordamos, isto é, às crenças que nos deixam mais confortáveis, mais acomodados.
Referências 
BOHM, David. Unfolding Meaning: a weekend of dialogue with David Bohm. Mickleton, Gloucestershire: Foundation House Publications, 1985.
BOHM, David. Thought as a system. Londres: Routledge, 1997.
BOHM, David. 
A totalidade e a ordem implicada: uma nova percepção da realidade. São Paulo: Cultrix, 1998.
BOHM, David. On dialogue. Londres: Routledge, 1998.
BUBER, Martin. I and thou. Nova York: Charles Scribner’s Sons, 1958.
BUBER, Martin. Do diálogo e do dialógico. São Paulo: perspectiva, 1982.
ELLINOR, Linda, GERARD, Glenna. Dialogue: rediscover the transforming power of conversation. Nova York: John Wiley & Sons, 1998.
HUSSERL, Edmund. Ideas: general introduction to pure phenomenology. Londres: George Allen & Unwin, 1931.
ISAACS, William. Dialogue and the art of thinking together. Nova York: Doubleday Currency, 1999. 
MARIOTTI, Humberto. As paixões do ego: complexidade, política e solidariedade. São Paulo: Palas Athena, 2000.
MARIOTTI, Humberto. "O automatismo concordo-discordo e as armadilhas do reducionismo".
www.geocities.com/pluriversu
VARELA, Francisco. Entrevista. (Publicada em Psychologie Heute e reproduzida em Hyperpagewww.kweb.it/hyperpage/varela/html)
YANKELOVICH, Daniel. The magic of dialogue: transforming conflict into cooperation. Nova York: Simon & Schuster, 1999.    

© Humberto Mariotti, 2001.

*Publicado na revista Thot (São Paulo) 76:6-22, 2001.


* HUMBERTO MARIOTTI.
 Professor e Coordenador do Centro de Desenvolvimento de Lideranças da Business School São Paulo. Consultor em desenvolvimento pessoal e organizacional. Conferencista nacional e internacional. Coordenador do Núcleo de Estudos de Gestão da Complexidade da Business School São Paulo.
O autor agradece a colaboração de CRISTINA ZAUHY, que atuou na pesquisa e elaboração deste artigo.
E-mail — zauhy@uol.com.br

Escutatório - Rubens Alves

 Escutatório

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.

Escutar é complicado e sutil. Diz o Alberto Caeiro que “não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma“. Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Aí a gente que não é cego abre os olhos. Diante de nós, fora da cabeça, nos campos e matas, estão as árvores e as flores. Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora. O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas. O que está fora não consegue entrar. A gente não é cego. As árvores e as flores entram. Mas - coitadinhas delas - entram e caem num mar de idéias. São misturadas nas palavras da filosofia que mora em nós. Perdem a sua simplicidade de existir. Ficam outras coisas. Então, o que vemos não são as árvores e as flores. Para se ver e preciso que a cabeça esteja vazia.

Faz muito tempo, nunca me esqueci. Eu ia de ônibus. Atrás, duas mulheres conversavam. Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos. (Contou-me uma amiga, nordestina, que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com as outras é comparar sofrimentos. Quanto maior o sofrimento, mais bonitas são a mulher e a sua vida. Conversar é a arte de produzir-se literariamente como mulher de sofrimentos. Acho que foi lá que a ópera foi inventada. A alma é uma literatura. É nisso que se baseia a psicanálise...) Voltando ao ônibus. Falavam de sofrimentos. Uma delas contava do marido hospitalizado, dos médicos, dos exames complicados, das injeções na veia - a enfermeira nunca acertava -, dos vômitos e das urinas. Era um relato comovente de dor. Até que o relato chegou ao fim, esperando, evidentemente, o aplauso, a admiração, uma palavra de acolhimento na alma da outra que, supostamente, ouvia. Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte: “Mas isso não é nada...“ A segunda iniciou, então, uma história de sofrimentos incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira.

Parafraseio o Alberto Caeiro: “Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma.“ Daí a dificuldade: a gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus. Certo estava Lichtenberg - citado por Murilo Mendes: “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas.“ Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...

Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos, estimulado pela revolução de 64. Pastor protestante (não “evangélico“), foi trabalhar num programa educacional da Igreja Presbiteriana USA, voltado para minorias. Contou-me de sua experiência com os índios. As reuniões são estranhas. Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. (Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio, como se estivessem orando. Não rezando. Reza é falatório para não ouvir. Orando. Abrindo vazios de silêncio. Expulsando todas as idéias estranhas. Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma). Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande desrespeito. Pois o outro falou os seus pensamentos, pensamentos que julgava essenciais. Sendo dele, os pensamentos não são meus. São-me estranhos. Comida que é preciso digerir. Digerir leva tempo. É preciso tempo para entender o que o outro falou. Se falo logo a seguir são duas as possibilidades. Primeira: “Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você falava eu pensava nas coisas que eu iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse falado.“ Segunda: “Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou.“ Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada. O longo silêncio quer dizer: “Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou.“ E assim vai a reunião.

Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio. Faz alguns anos passei uma semana num mosteiro na Suíça, Grand Champs. Eu e algumas outras pessoas ali estávamos para, juntos, escrever um livro. Era uma antiga fazenda. Velhas construções, não me esqueço da água no chafariz onde as pombas vinham beber. Havia uma disciplina de silêncio, não total, mas de uma fala mínima. O que me deu enorme prazer às refeições. Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa. Podia comer pensando na comida. Também para comer é preciso não ter filosofia. Não ter obrigação de falar é uma felicidade. Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro era participar da liturgia três vezes por dia: às 7 da manhã, ao meio-dia e às 6 da tarde. Estremeci de medo. Mas obedeci. O lugar sagrado era um velho celeiro, todo de madeira, teto muito alto. Escuro. Haviam aberto buracos na madeira, ali colocando vidros de várias cores. Era uma atmosfera de luz mortiça, iluminado por algumas velas sobre o altar, uma mesa simples com um ícone oriental de Cristo. Uns poucos bancos arranjados em “U“ definiam um amplo espaço vazio, no centro, onde quem quisesse podia se assentar numa almofada, sobre um tapete. Cheguei alguns minutos antes da hora marcada. Era um grande silêncio. Muito frio, nuvens escuras cobriam o céu e corriam, levadas por um vento impetuoso que descia dos Alpes. A força do vento era tanta que o velho celeiro torcia e rangia, como se fosse um navio de madeira num mar agitado. O vento batia nas macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram. Estranhei. Os suíços são sempre pontuais. A liturgia não começava. E ninguém tomava providências. Todos continuavam do mesmo jeito, sem nada fazer. Ninguém que se levantasse para dizer: “Meus irmãos, vamos cantar o hino...“ Cinco minutos, dez, quinze. Só depois de vinte minutos é que eu, estúpido, percebi que tudo já se iniciara vinte minutos antes. As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio. E eu comecei a me alimentar de silêncio também. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. E música, melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar. A música acontece no silêncio. É preciso que todos os ruídos cessem. No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós - como no poema de Mallarmé, A catedral submersa, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Me veio agora a idéia de que, talvez, essa seja a essência da experiência religiosa - quando ficamos mudos, sem fala. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar. Para mim Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também. Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto... (